Inalador ou Exalador?

fonte: www.adrianabreukink.com

por Adriana Breukink

tradução: Gustavo de Francisco

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Durante o estudo nos finais de semana liderados por Brunhilde Holderbach (flautista e especialista neste assunto), eu estudei este fenômeno junto com Bernhard Mollenhauer, Geri Bollinger (Küng) e Anneke Boeke.

Nós podemos dividir os flautistas doces em dois grupos:

1. Aqueles que sopram ATIVAMENTE, com energia e FORÇA na expiração
2. Aqueles que deixam o ar fluir pela flauta doce POR SI MESMO, SEM PRESSÃO

Aqui, a quantidade de ar e volume não serão considerados.

1. Os flautistas ATIVOS e ENÉRGICOS são EXALADORES; eles expiram ativamente mas inspiram passivamente
2. Os flautistas PASSIVOS e RELAXADOS são INALADORES; eles expiram passivamente mas inspiram ativamente

1. Os EXALADORES expiram ativamente com os músculos laterais, e após uma pequena pausa, eles deixam o ar entrar simplesmente relaxando os músculos intercostais. Eles usam poucos músculos para inspirar. Depois da inspiração, a expiração segue imediatamente. Os músculos do  peito (peitoral) e o estômago (abdominal) dificilmente são usados durante este processo.
Os músculos abdominais apenas mantém os órgãos internos imóveis. O uso ativo dos músculos intercostais para expirar duram 3 ou 4 vezes mais tempo do que a inalação de ar passiva para os pulmões.

2. Os INALADORES usam seus músculos peitorais ativamente para inspirar, expandindo o um pouco peito, e permitindo que o mesmo se eleve ligeiramente. Eles fazem uma pausa após a inspiração, depois soltam o ar passivamente. A inalação ativa acontece imediatamente depois que o ar saiu dos pulmões. Os músculos abdominais e intercostais permanecem relaxados tanto quanto possível durante a inalação, deixando mais espaço para os pulmões se expandirem. A inalação leva 3 a 4 vezes mais tempo que a liberação do ar dos pulmões.

Para mim, Adriana Breukink, como uma construtora de flautas, é importante fazer os instrumentos certos para cada tipo de flautistas – inaladores ou exaladores.
Você deve conhecer o sentimento, quando você experimenta uma nova flauta e alguma coisa não está de acordo com a maneira que você está acostumado a tocar (independentemente da qualidade do instrumento).
Isto indica o que se deve fazer no tamanho da abertura no teto do canal de ar, na cabeça da flauta.

EXALADORES preferem uma abertura menor com mais resistência para que possam usar mais pressão pois o ar será obstruído de alguma forma pelo canal estreito.
INALADORES são mais beneficiados por canais mais abertos onde o ar pode entrar por si mesmo, sem ser obstruído pela entrada estreita.

Se um INALADOR tocar uma flauta doce com o canal muito estreito, o som será instável e não muito cheio (redondo) pois o flautista terá que usar muitos músculos que ele só consegue controlar com trabalho duro e muita energia mental.
Por outro lado, um EXALADOR terá muita dificuldade com uma flauta com canal muito aberto. Ele ou ela perderá muito ar rapidamente, e terá que usar muito mais ar que o normal, e isso vai diminuir a qualidade do som e expressão.

Além disso, os exaladores preferem a posição da mão com os furos 3 e 6 e/ou 7 fora de centro, de forma que os dedos fiquem inclinados em relação ao instrumento.
Inaladores preferem manter os dedos alinhados.

Isto tem a ver com o posicionamento do corpo, o que afeta diretamente a posição das mãos e dos braços.

Virdung

Virdung

Exalador

 

 

 

 

Hotteterre

Hotteterre

Inalador

 

 

 

 

Exaladores: Joris van Goetem, Han Tol

Eu acredito no princípio que o som mais interessante e natural será do flautista que usa o canal que mais se adapta a si próprio de forma que possa tocar adequadamente ao seu próprio “tipo”. Uma pessoa com a técnica relativa a sua própria maneira de tocar aliado com a flauta certa pode contribuir a isto, pois o flautista estará mais relaxado e assim estará mais preparado para mostrar toda sua força de expressividade.
Tente, como sempre, analisar sua técnica de forma muito crítica. Algumas vezes muitos anos de estudo com um professor tentando te ensinar a técnica oposta ao seu próprio jeito de tocar, obrigando o aluno a tocar da mesma forma que ele. Muitas escolas focam na técnica para exaladores. Durante meu tempo de estudo no conservatório, por exemplo, Quantz foi severamente ridicularizado pela sua técnica de respiração na qual promove o peito estufado e empinado ao inspirar.

TratadoQuantz

“Para longas passagens o flautista deve inspirar uma grande quantidade de ar, e para isso deve abrir a garganta e expandir inteiramente o peito, levantar os ombros, e manter o peito cheio de ar tanto quanto for possível, e assim economizando o ar ao assoprar na flauta. Mas se você ainda achar necessário respirar entre notas rápidas, você precisa fazer a nota anterior bem curta, inspirar o ar rapidamente apenas com a garganta, e apressar ligeiramente as próximas duas ou três notas, de forma a não atrasar o tempo nem omitir nenhuma das notas…”

 

O “pobre” homem era apenas um inalador!

As seguintes características podem ser percebidas pelos diferentes tipos de respiração

INALADORES
Gostam de se mover muito mas a flauta permanece parada (eles se movem em torno da flauta)
Dedos retos em relação à flauta, preferivelmente com a ponta dos dedos em cima dos furos
Dedos relaxados com abertura ativa e fechamento passivo dos furos
Tocam com muita tensão nos lábios
O ar se move mais devagar
As bochechas ficam inchadas
Tocam sentados; preferem (acreditem!) descansar preguiçosamente apoiado no encosto da cadeira para que tenham mais apoio dos músculos intercostais na respiração
Tocando com estantes, geralmente com a perna direita à frente e apoiando-se nos calcanhares

EXALADORES
Tocam parados, mas movem a flauta (eles brincam com a flauta)
Preferem dedos inclinados sobre a flauta, com punhos virados para dentro
Batem com as pontas dos dedos ao fechar os furos ativamente
Tocam com lábios relaxados
Ar se move mais rápido
Bochechas mais tensas
Tocando sentados, preferem ficar eretos em uma cadeira sem encosto, para que possam usar os músculos intercostais adequadamente
Tocando com estantes, geralmente com a perna esquerda à frente e apoiando na ponta do pé.

Para a determinação de qual é o seu próprio tipo de respiração, a influência do sol ou da lua deve ser avaliada. Você pode seguir o link www.terlusollogie.de (em alemão) para determinar o seu próprio tipo de respiração.
Para ficar claro, aqui está uma citação do site:

“Este estudo começa com a observação que existem dois tipos opostos de respiração. Nós chamamos de inaladores (Einatmer) e exaladores (Ausatmer). Cada pessoa está associada a apenas um tipo e seu tipo não pode mudar durante toda a sua vida.

O inalador salienta sua inalação. A inalação é apoiada por uma posição invertida. Ao sentar-se, o inalador estica as pernas e para poder levantar a cabeça precisa de um encosto. Na mesa as suas articulações do cotovelo são esticadas  os pulsos dobrados tanto quanto possível. O inalador não gosta de saltos altos. A cabeça é levantada, e quando corre o peito inclina-se para a frente. O inalador corre esticando os joelhos e articulações dos braços, os braços balançam claramente, e prefere as curvas para a esquerda. O inalador necessariamente precisa de um aquecimento antes de qualquer atividade física e mantém suas extremidades no corpo. Ele respira no tórax e sente frio com muita facilidade. O clima favorável são zonas úmidas.

 

Inalador

inalador em pé

 

 

 

 

 

 

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inalador sentado

 

 

 

Nós geralmente verificamos o comportamento oposto. Se um inalador, por exemplo, andar muito com saltos altos, irá ter sérios problemas de saúde. Infelizmente, essas coisas não são normalmente associadas ao comportamento inadequado ao tipo de respiração (ver os estudos de caso). Dessa forma determinar o seu tipo de respiração e aprender o comportamento correto é de grande importância para sua saúde.

O exalador salienta sua expiração. A exalação é apoiada por uma posição de bruços. Ao sentar, ela não precisa de um encosto e prefere as pernas dobradas. O exalador tenta trazer os pés sob o assento e escreve com o punho esticado. O exalador pode ficar bem em saltos altos. A cabeça é facilmente abaixada (apesar do tronco ereto). Seus braços balançam calmamente, as articulações do braço nunca são esticadas, preferindo as curvas certas. Mantém os braços ligeiramente distantes do corpo e prefere manter o trabalho, respira usando o diafragma ou a cavidade abdominal. O clima favorável é seco, apenas uma exalador pode tolerar o clima do deserto. ”

 

Exalador em pé

exalador em pé

 

 

 

 

 

 

exalador sentado

exalador sentado

 

 

Para mais informações, sigam o link http://www.terlusollogie.de

Abaixo alguns exemplos de corpos e posição das mãos para que você possa identificar se alguém é in- ou ex-alador
ExaladorEXALADOR

Anônimo 1750. The complete tutor for the FLUTE

 

 

 

 

 

Inalador

INALADOR

Wiegel 1722. Musicum Theatrum

 

 

 

 

InaladorINALADOR

Quer formar um grupo musical? Dicas para começar!

Algumas pessoas têm perguntado qual o caminho para se formar um grupo de música de câmara atuante. Todos sabemos que no Brasil isto não é fácil. Quem possui um emprego fixo sabe também que não é fácil trabalhar para outras pessoas que não compartilham dos mesmos objetivos, e os obrigam a uma relação de trabalho hierárquica. Vou colocar aqui algumas coisas que penso ser importante.

Primeiramente, é importante encontrar pessoas que pensem parecido, ou seja, que tenham as mesmas vontades, os mesmos desejos em relação ao trabalho, e que estejam a fim de tocar (exclusivamente). Neste ponto, existem pelo menos duas alternativas em relação aos objetivos: manter um grupo fixo com ensaios regulares (esta foi a escolha do Quinta Essentia Quarteto) ou juntar pessoas para tocar para um único concerto. A primeira escolha poupa muito trabalho quando pensamos a longo prazo, e embora a segunda escolha pareça dar menos trabalho com menos compromisso, é muito mais difícil de se conseguir trabalho para o grupo, pois a produção tem sempre que começar do zero a cada novo trabalho, e muitas vezes não agrega credibilidade ao trabalho.

No Brasil, geralmente os grupos se formam pelo segundo método. Só reúnem-se para tocar quando tem algum dinheiro em vista, o famoso “cachê”, por exemplo, e não estão a fim de ter um trabalho regular, um momento para trocar ideias e construir juntos o trabalho que vai ser apresentado por todo o grupo.

A vantagem dessa escolha, ainda me refiro ao mundo do cachê, é pouca dedicação envolvida, e muitos músicos usam como argumento que, por já terem muita técnica, basta um ou dois ensaios para que o repertório esteja “pronto”.

A desvantagem é a energia gasta na produção do grupo, que a cada concerto começa tudo do zero. Precisa encontrar os músicos, definir dia(s) e horário(s) para o(s) ensaio(s) compatíveis com a agenda de todos envolvidos, fazer fotos do grupo (afinal, nada pior que um grupo que divulga uma foto com músicos diferentes daqueles que se apresentam), gravar o ensaio para poder mostrar trabalho para o patrocinador, escrever sobre o projeto, e muito mais que só quem faz este tipo de trabalho sabe como é.

 

Falo agora da primeira opção, que é a que tenho maior experiência.

Essa parte do “estar a fim de tocar” é extremamente importante porque nos primeiros anos vocês terão muito trabalho, investimento, e pouco retorno. Normalmente começamos a estudar música porque gostamos, mas ao profissionalizarmos muita gente se esquece que no início gostávamos de tocar. Nenhuma empresa nasce sem investimento, por que seria diferente com um grupo musical? Quando gostamos, tudo isso é feito por prazer, e os frutos serão colhidos em seguida.

Bem, por isso, é importante que esteja claro para todos que terão que investir muito, para que no futuro tenham retorno disso.

Tendo as pessoas para tocar, é importante escolher um dia da semana, (ou dois, ou mais), para deixar marcado um ensaio regular. São nas reuniões e ensaios que a identidade do grupo se consolida. Se os ensaios são apenas esporádicos e curtos, o grupo levará muito mais tempo para ter sinergia, para criar “a liga” que é percebida facilmente pelo público durante as apresentações.

Definir um nome para o grupo também é importante. É bom que todos do grupo acreditem neste nome, pois levará a identidade do grupo ao público.

Essas coisas são as primeiras e as mais fáceis.

 

Segundo passo:

Investimento

Nessa fase o investimento ainda não é necessariamente financeiro.

1. investimento de tempo para ensaio e estudo de cada um dos membros do grupo

2. investimento de tempo para pesquisa de repertório (internet, bibliotecas de partituras, flautistas, arranjos e novas composições)

3. investimento para preparar um repertório em conjunto

4. investimento para que o grupo faça aulas com um professor (para orientar um trabalho inicial do grupo, isso ajuda muito)

Depois que o repertório estiver ficando pronto será necessário fazer um investimento de tocar gratuitamente, sem compromisso, para um público, mesmo que pequeno. A prática de palco é muito diferente da prática de ensaios, pois existem coisas que acontecem no palco que não é possível ensaiar ou prever.

Gravar algumas peças em áudio e/ou vídeo para ouvir e avaliar o resultado, faz com que o grupo cresça também. Quando estamos tocando, temos uma percepção individual dos acontecimentos da performance em grupo. Essa experiência de gravar e todos avaliarem o resultado em conjunto, faz com que tenhamos uma percepção externa de um todo, o que facilita na busca pela identidade sonora e musical coletiva.

Fazer uma página do grupo na internet. Esta pode ser feita através de plataformas gratuitas como wordpress e/ou páginas em redes sociais. Isso ajuda a divulgar o trabalho e dar credibilidade a ele.

Fazer fotos de excelente qualidade para o grupo. Em um primeiro momento as fotos podem ser realizadas com uma boa câmera (em um tripé) e boas ideias.

 

Terceiro passo:

Divulgação e trabalho:

Essa fase, seguida de todos os passos anteriores, começa com a redação de projetos e releases, em seguida, com o envio desses para espaços culturais, saber e conhecer os editais de cultura da região em que vocês residem e do Brasil.

Nesse passo, o mais importante é não desistir. Dos mais de 5.000 projetos que enviamos no primeiro ano do Quinta Essentia, só recebemos retorno de 3 projetos. Dois dos contatos nos disseram: recebemos o seu projeto. Apenas um deu certo!

Ainda recebemos contatos de pessoas que receberam os projetos naquele ano. No ano passado fomos tocar em lugares que nos ligaram dizendo: Recebi um projeto de vocês em 2006, vocês gostariam de participar da nossa série de concertos neste ano???? 2012???

É um esforço e um trabalho enorme, que vale a pena! Nenhum trabalho é em vão. Nem que seja para que as pessoas saibam que vocês existem. O resto, vem com o tempo.

Em qualquer trabalho que tenha a proposta de ser profissional, é importante que os envolvidos tenham em mente de oferecer o melhor que podem dar. Isto quer dizer: ter o melhor equipamento disponível (no caso de músicos, nos referimos aos instrumentos), que o trabalho seja o melhor possível (por isso a grande importância de ensaios regulares), que o trato interpessoal seja o mais educado e cordial possível (afinal todas as pessoas são importantes nesse processo, seja como público ou como contratante), e o mais importante de tudo: que amemos aquilo que nos propomos a fazer, pois esta é a única forma de fazer bem e não sofrer com o esforço e com as respostas negativas.

Especialmente aos flautistas doces, fica a nossa recomendação: na medida do possível, troquem seus instrumentos de plástico por flautas de madeira de boa qualidade. Isto faz grande diferença na qualidade do som produzido, e mostra credibilidade ao trabalho.

 

O flautista Paul Leenhouts, convidado para a sexta edição do ENFLAMA, organizado pelo Quinta Essentia em junho passado, disse que nenhum grupo pode se considerar grupo com menos de 10 anos de trabalho regular. A fala dele foi: para um grupo sério, 10 anos de trabalho em conjunto não é nada. Veja o vídeo (em inglês) abaixo:

Ele fala com muita experiência pois fundou o Amsterdam Loeki Stardust quartet (www.loekistardust.nl) e o grupo de seus alunos, coordenado por ele, The Royal Wind Music (http://www.royalwindmusic.org/).

Excelentes trabalhos. Vale a pena dar uma olhada.

 

Até e boa sorte com a formação de novos grupos musicais!

 

flautas doces modernas

Oi Pessoal,

Tenho visto um grande movimento de construtores fazendo pesquisas e começando a vender flautas doces que não são cópias de instrumentos históricos, ou ao menos, não têm esta proposta em mente. Recentemente experimentei alguns destes instrumentos e gostaria de discutir as impressões sobre estes instrumentos e também sobre este movimento.

Primeiramente devo citar as flautas quadradas ou “square recorders” que usamos já há algum tempo no Quinta Essentia. Essas flautas foram desenvolvidas pelo construtor Joachim Paetzold (Alemanha) em meados da década de 60, e atualmente é fabricada pelo seu sobrinho Herbert Paetzold (maiores informações em http://www.alte-musik.info/). A flauta mais aguda desta família é a baixo ou basseto em Fá, e a mais grave é a subcontrabaixo em fá (2 oitavas abaixo da flauta baixo). A idéia dessas flautas está nos tubos ‘quadrados’ do órgão, que muitas vezes são construídos em madeira e se encontram no interior do instrumento, e são feitos desta maneira para que o custo seja menor comparado aos tubos de estanho ou cobre que são visíveis. Nosso amigo Paetzold pensou que poderia fazer flautas usando o mesmo princípio, e obteve um grande sucesso. As flautas tem muito mais volume do que as flautas renascentistas da mesma tessitura, além de ter uma resposta de articulação excelente. Porém há um problema, com relação a esses instrumentos, que não está na hora de tocar, mas na hora de transportá-los, pois são grandes e pesados (mas isso já é esperado em instrumentos tão graves).

Um outro trabalho exemplar que venho contar em primeira mão é sobre a flauta doce Eagle, foi desenhada pela Adriana Breukink (visite http://www.adrianabreukink.com/Home.html). Esta é uma flauta contralto, com uma chave para alcançar a nota mi grave, e embora seja baseada em uma flauta renascentista com furos grandes e corpo cilíndrico (não cônico como as barrocas), tem o timbre muito diferente das flautas renascentistas ou barrocas. O grande diferencial desta flauta é a potência sonora. Ela pode tocar em conjunto com violino, piano ou outros instrumentos modernos sem que os outros músicos precisem tocar mais piano para equilibrar o grupo, ou até mesmo tocar numa orquestra moderna como solista sem a necessidade de amplificação. Selecionei algumas fotos que fiz em seu ateliê para que conheçam melhor este instrumento. Reparem que as cabeças são diferentes, experimentamos cerca de 15 cabeças diferentes que ela usou em sua pesquisa até achar o “voicing” mais adequado, que possui a janela feita de metal. Até agora somente cerca de 30 flautas Eagle foram vendidas, mas em breve serão fabricadas pela marca Küng (visite http://www.kueng-blockfloeten.ch/en/index.php)

a flautista Renata Pereira e a flauta doce Eagle

Ainda da Adriana, tenho a dizer sobre outras flautas. Ela também constrói o que ela chama de “dream recorders” ou “sonho de flautas”. Ela fez estas flautas buscando um instrumento com todas as vantagens da flauta barroca (afinação mais estável, dedilhado mais amigável) somadas às vantagens da flauta renascentista (som potente, articulação mais presente, graves com bastante volume). Existem “dream recorders” soprano, alto, tenor e baixo, e estas flautas são produzidas pela Mollenhauer (visite http://www.mollenhauer.com/), mas a Adriana continua produzindo sobre encomenda em madeira melhor do que as de fábrica. A soprano e contralto feitas pela Adriana são muito melhores que as de fábrica; já a tenor e baixo têm qualidade superior mas não são tão diferentes das de fábrica.

A construtora de flautas doces Adriana Breukink e sua mais recente pesquisa: a flauta doce Eagle

Pensam que acabou? Não! A Adriana tem um outro projeto maior (na verdade, beeem maior) mas que só foram produzidas 3 flautas como essa até agora (uma dela usada pelo Bassano Recorder Quartet, uma do Amsterdam Loeki Stardust Quartet, e outra do Royal Wind Music), e ela acaba de receber a 4.a encomenda (do Flanders Recorder Quartet). Eu estou falando da sub-contrabaixo em Si bemol (vejam a foto na abertura da página dela), que parece ser uma flauta renascentista, mas que ela desenvolveu a partir de uma sub-baixo em fá. Historicamente existe uma flauta tão grave como esta, mas a flauta histórica é na verdade uma flauta sub-baixo em Fá com uma extensão, com chaves para serem tocadas por outra pessoa, ou com os pés, ou de alguma outra forma (nada cômodo, não acham?). No site dela tem uma explicação, deste instrumento, melhor que a minha, vale a pena verificar. Experimentei a flauta, ela é algo mais que uma bazuca para tocar, pois não é possível tocar mais que 3 ou 4 notas sem respirar, parece que todo ar dos pulmões é sugado para dentro da flauta. Vejam um vídeo dela tocando: http://www.youtube.com/watch?v=aQFqYbaiG1w

Mais informações também sobre o charme da BIG BABE assim chamada pelo consort Royal Wind Music na Holanda. http://www.facebook.com/BigBabeRWM

Existem também alguns fabricantes que investiram para produzir seus próprios instrumentos modernos. A Moeck tem as flautas Ehlert (visitem http://www.moeck.com/index.php?id=29&L=1) soprano, alto e tenor, da qual tive a oportunidade de experimentar em algumas lojas de instrumentos na Europa. Embora a Moeck venda estes instrumentos como flautas modernas, em relação à sonoridade, elas são bem parecidas com as flautas barrocas, exceto por alguns dedilhados na 3.a oitava que são facilitados e não precisam do uso da perna para tampar o furo de baixo.

Já a Mollenhauer está um passo à frente em relação às outras marcas, pois possui 2 modelos de flautas modernas: as flautas Helder alto e tenor, e as flautas modernas tarasov-paetzold soprano e alto. As flautas tarasov-paetzold ou “harmonic recorders” são flautas com corpo cilíndrico que garantem uma maior uniformidade de timbre em todo instrumento e graves mais potentes, e conforme diz no site estas flautas possuem “harmônicos afinados” e isso possibilita tocar até 3 oitavas completas na flauta contralto, mas com um dedilhado todo especial na 3.a oitava. Porém o grande diferencial está mesmo nas flautas helder: estas flautas possuem o bloco e o teto móvel, de forma que é possível ajustar a altura do bloco durante a música (basta apertar os lábios ou girar um parafuso), ajustar o tamanho do canal de ar, 3 opções para trocar o material do teto: cerâmica (som bem diferente e “moderno”), grenadilla (som potente com excelente projeção) e rosewood (som mais parecido com flautas barrocas). Além disso possuem extensão para o mi grave na contralto e si grave na tenor, uma chave para tocar piano sem precisar de dedilhados alternativos, e também alcança 3 oitavas inteiras. Estas flautas helder são praticamente um outro instrumento diferente da flauta doce que já sabemos tocar, e temos que re-aprender a tocar se quisermos nos aventurar no mundo helder; a maneira de assoprar é bem diferente, e algo que me deixou bastante curioso: não existem variações de timbre entre as notas, mesmo aquelas de forquilha que costumam ter o som velado, a flauta inteira tem som uniforme como os instrumentos modernos (flauta transversal, oboé, etc).

Devo comentar de mais um construtor que infelizmente não pude experimentar os instrumentos, mas que está causando um grande impacto no mundo flautístico na Europa. Ele é chamado Ernst Meyer, e está fabricando flautas barrocas, com cara de flautas barrocas, mas com um ajuste no canal e no voicing que tornam as flautas um “canhão” conforme me contaram. Muitos flautistas como Pierre Boragno estão vendendo flautas excelentes como as feitas pelo Morgan (um famoso construtor já falecido) para comprar flautas do Meyer. Embora as flautas dele ainda sejam flautas “barrocas”, elas têm uma concepção de som bem diferente da concepção da música historicamente orientada.

Termino aqui o meu relato sobre os instrumentos, mas gostaria de frisar que fico muito feliz em ver que a música continua viva, que existem pessoas buscando outras características, outras possibilidades para nosso instrumento, e isso torna a flauta doce cada vez mais interessante. Isso abre espaço para um novo repertório, abre espaço para novos compositores, e traz algo novo para o público o que é ainda mais importante.

P.S. Existe um flautista e gambista chamado Jan Goorissen que desenvolveu uma viola da gamba moderna feita em fibra de carbono, e uma viola da gamba elétrica. Ele possui uma loja de flauta doce excelente em Arnhem/Holanda que tem muitas flautas a pronta entrega e que podem ser experimentadas antes de comprar, quem estiver viajando pelos arredores de Amsterdam ou Bruxelas vale a pena pegar um trem e visitá-lo (não esqueçam de ligar antes para marcar). O site é http://www.blockfluteshop.com/

Grande abraço
Gustavo
www.quintaessentia.com.br